quinta-feira, 28 de abril de 2011

FANTASTICO

A popularidade dos chás e das infusões não tem sido acompanhada de estudos científicos. A falta de pesquisa abre caminho para indicação de tratamentos inúteis e demora na busca por assistência médica.

Fantástico
 
Você conhece a babosa, aquela planta que se usa muito no cabelo? Pois tem gente que diz que ela também é boa para o câncer. Mas não é não. Pode fazer mal para quem tem a doença. Você vai saber por que com o Dr. Drauzio Varella.

“Me foi passado que a babosa era um remédio bom pra câncer. A gente não tinha muita opção, não tinha um remédio específico. Eu já sabia o diagnóstico, mas tinha que esperar a minha vez para ser atendido aqui”, diz um paciente.

“Mas de onde veio a ideia de tratar câncer com babosa?”, pergunta o Dr. Drauzio Varella.

“Bem, essa ideia surgiu na população. Alguém usou, algum dia, e foram usando e esse conhecimento popular se expandiu”, explica o engenheiro agrônomo da Embrapa, Osmar Lameira.

“Não estou achando que o tratamento alternativo não tem que existir. Eu acho que tem que existir, mas assim como os tratamentos convencionais foram estudados, avaliados para se ter certeza de que eles têm alguma eficiência, vale a pena fazer a mesma coisa nesses tratamentos, porque eles fazem mal”, afirma o médico oncologista Riad Younes.

Infelizmente a popularidade dos chás e das infusões não tem sido acompanhada de estudos científicos. A falta de pesquisa abre caminhos para indicação de tratamentos inúteis, para a demora em buscar assistência médica adequada e para a prática do charlatanismo.

“Na Embrapa, eu recebo mais ou menos de seis a sete pessoas por dia. Tem época que eu chego a receber dez, quinze. A maioria das pessoas que tem nos procurado aqui é com problema de câncer”, diz o agrônomo Osmar Ladeira.

“Jamais eu vou deixar de acreditar nas plantas”, afirma a professora aposentada Sebastiana Teixeira de Oliveira.

Tratar uma doença grave com produtos alternativos pode ter consequências perigosas. Sebastiana Teixeira de Oliveira tinha um tumor na mama medindo pouco mais de um centímetro. Um ano e meio depois, o tumor já estava com mais de dez centímetros e ela precisou de uma cirurgia radical e quimioterapia. Agora, um exame de rotina mostrou que a doença pode ter voltado.

“Existe a possibilidade de que essa lesão seja decorrente do câncer que ela teve no passado”, afirma o mastologista Ruffo de Freitas Júnior.

“Eu espero que o resultado do exame confirme o que a terapeuta das plantas disse que não tinha nada”, diz Sebastiana.

A terapeuta fez um exame em Sebastiana chamado “bioteste”. Ela usou uma varinha de metal e fotos de plantas e quase convenceu Dona Sebastiana a adiar a biópsia. Além da recomendação de não fazer a biópsia, a receita do bioteste incluía aplicação de argila no pescoço e uma mistura de sete ervas. Onde Dona Sebastiana conseguiu tudo isso? Na Igreja Santa Luzia, em Aparecida de Goiânia.

“Muitos dos que divulgam tratamentos alternativos são ligados a algumas religiões, padres e outros e a pessoa vai para lá, quer dizer, se eu não acreditar no padre, em quem eu vou acreditar?”, afirma o médico Riad Younes.

O bioteste foi trazido para o Brasil nos anos 1990 por um padre, que hoje é o coordenador de centenas de centros que oferecem o método milagroso em todo o país. Muitos funcionam junto a paróquias ou entidades ligadas à igreja católica.

Argila não é quimioterapia. A quimioterapia, usada a partir da Segunda Guerra Mundial, age destruindo as células que se reproduzem mais depressa, como as do câncer, mas provoca efeitos colaterais: queda de cabelo, enjôo, diarreia, cansaço. Muitos pacientes chegam a pensar que estão pior, param o tratamento e buscam outros que consideram menos agressivos.

O Dr. Riad Younes foi diretor do Hospital do Câncer de São Paulo, onde fez uma pesquisa com mais de três mil doentes para descobrir quantos usavam algum tipo de terapia alternativa. Dos pacientes, 48% responderam sim. Qual o maior perigo desses tratamentos?

“O perigo: o abandono, desistência ou até complicar o tratamento por interação entre medicamentos e tratamentos alternativos”, afirma o Dr. Riad Younes.

Ninguém sabe todos os princípios ativos que cada planta possui. Quando alguém usa chás, extratos ou outros derivados, ao mesmo tempo em que faz um tratamento convencional, corre o risco de uma das substâncias da planta reagir com o medicamento, provocando efeitos inesperados, às vezes, perigosos.

“Uma planta pode ter 400, 500 componentes e você não sabe quantos deles estão interagindo no seu sistema do fígado e modificando toda a parte metabólica”, explica o professor de farmacologia da UFSC, João Batista Calixto.

“Uma amiga me falou sobre o chá de picão da praia, que ele é bom para hepatite”, conta a dona de casa Fátima Regina Figalo. “Tomei o chá. Fui ficando inchada, de 90kg fui para 73kg. Fiquei bem debilitada”, diz.

Fátima Regina ficou quase um ano doente e teve que tirar a vesícula. O diagnóstico do médico: intoxicação.

“Depois ele foi ao computador e me mostrou que o picão da praia é tóxico e pode até matar. Foi esse chá que eu tomei”, afirma a dona de casa.

A farmacêutica Rita Vieira estudou a relação entre remédios contra o câncer e plantas. Ela concluiu que mais da metade dos pacientes que faziam os dois tratamentos estavam sujeitos a interações medicamentosas.

“A babosa ode causar efeitos colaterais bastante sérios. Pode ocasionar problemas cardíacos, fraqueza muscular, tonturas, dentre outras”, alerta a farmacêutica Rita Vieira.

“A babosa dá diarreia. Então, o que acontece? Você faz quimioterapia, um dos sintomas que faz a gente parar de dar quimioterapia é diarreia intensa. Então, a pessoa toma babosa, ela não fala para o oncologista que está tomando. Aí suspende a quimioterapia”, afirma o Dr. Riad.

“Há casos de que a planta não faz mal por ela própria. Ela tira o efeito ou piora do outro medicamento que a pessoa está tomando”, ressalta o professor de farmacologia da UFSC, João Batista Calixto.

“O mais popular de todos os antidepressivos é o hipérico, erva de São João. Ele tem interação com pelo menos seis classes de medicamentos, entre inclusive anticoncepcionais, remédios para diminuir a rejeição de transplantes, remédios para diminuir a ansiedade e assim por diante”, afirma o toxicologista do Hospital das Clínicas de São Paulo Anthony Wong.

“Somente 8% dos doentes contavam para o oncologista que eles usavam tratamento alternativo e somente 0,5% de todos os prontuários o oncologista escreveu que ele toma tratamento alternativo. Mas é importante anotar porque pode ser a dica de uma complicação”, explica o Dr. Riad Younges.

Na sala de cirurgia, Sebastiana Teixeira de Oliveira ainda não sabe que as sete ervas e a argila não ajudaram. O trabalho da equipe médica continua.
“A gente já sabe que a doença voltou e agora é começar um novo tratamento para ela.

“O doente, ele aposta, ele acredita no tratamento e depois, ele é frustrado. Quer dizer, foi mentira, então, como se fosse uma propaganda enganosa”, afirma o Dr. Riad.

Hoje, em casa, Dona Sebastiana diz que fez bem de não seguir as recomendações dos terapeutas alternativos. Se tivesse esperado mais tempo para fazer a biópsia, a doença teria avançado. Agora, ela está enfrentando a quimioterapia com mais confiança.

Um comentário:

  1. Re,você precisa saber o bem que você faz as pessoas,postando sua história!!! Parabéns grande bjoo...

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